Monday, June 18, 2007

A Lenda do Curupira

Caçula de outros 2 irmãos homens, nunca pedi um irmãozinho para a minha mãe. Digo então que o Rafa é como se fosse o irmão mais novo que eu não gostaria de ter. Na impossibilidade de pedir especificamente um "Rafa" para a minha mãe (nem Mãe Diná poderia prever o enconto), e contando com a higiene da mesma – ele mesmo diz que mais de 3 filhos caracteriza a falta dela, nós somos isso que somos. Isso que eu não sei classificar.

Sendo o Rafa uma das pessoas mais sensatas de quem já tive noticias, ele entenderá minha falta de vocabulário. Tão sensato que às vezes perde a sensatez de propósito pra não envergonhar os outros reles mortais. Tão sensato que às vezes parece que ele não existe, que é uma lenda como o Saci. Só que ele existe, sim. Tem as duas pernas e não fuma cachimbo.

Li outro dia que o excesso de realismo numa pessoa acaba, involuntariamente, tornando-se pessimismo. A realidade é dura, o Rafa sabe, mas a dele surge mais bonita, elegante e bem-humorada que a dos outros. Obra dele mesmo. Ou do Saci, se eu acreditasse em seres folclóricos.

Não sei se Rafael Comenale vai gostar dessa minha inclusão do Saci no texto, já que nenhum de nos dois tem simpatia por tradições populares como o bumba-meu-boi, a capoeira, o arroz doce de quermesse e a mania de colocar milho verde em tudo. Pra ser sincera, ele vai gostar, sim. Mas só porque ele é a pessoa que mais me entende no mundo inteiro. Se fosse outro, ia achar que eu sou louca.

E ele só me entende tão bem porque me conhece como nenhuma outra pessoa. Tanto que às vezes me da vontade de chorar, bem na frente dele, mesmo sabendo que ele não vai derrubar nem uma lagriminha de compaixão. E eu finjo que entendo esse lado dele que não chora porque ele releva todos os meus lados obscuros sem passar a mão na minha cabeça.

Parte dessa cumplicidade foi trazida pelo tempo, mas a outra só pode ser mesmo obra daquele garotinho perneta. O timing sincronizado, as lembranças, os traumas de criança e, claro, o humor me são inexplicáveis ate hoje. E como já aprendi com o Rafa, tem certas coisas que não precisam de explicação (mas se eu quiser, ele tenta, tem uma paciência de monge comigo).

Ele vive levantando minha bola, falando como eu sou inteligente, mas bom mesmo é ser como ele, que entende as pessoas ao invés de corrigir seu português. Que descobre as entrelinhas dos meus discursos metidos a alguma coisa, que me fez começar a escrever esse blog sem eu nem perceber direito.

Ao contrário do que eu já pensei, nós não somos tão parecidos. Ele não gosta de cachorro, eu não tenho paciência pra ir ao cinema. Ele não liga pra comida e eu me formei cozinheira. Eu não gosto de comprar roupa e ele tem cacife pra participar do Esquadrão da Moda.


Se fossemos irmãos não ia ser tão bom. Eu iria querer cachorro e ele estaria mais preocupado com as rosas do banheiro. Iria brigar comigo quando eu chamasse a Kylie Minogue de desafinada e eu não suportaria viver assim de perto com a falta de apreço que ele tem pelos Rolling Stones.

O Rafa não é a minha metade nem eu a dele. Somos nós mesmos, melhorados um pela presença do outro, como azeite e orégano. Como eu e o Rafa, sentados em qualquer lugar da cidade tendo a conversa mais confusa e desencontrada possível. O nosso timing – Rafael Comenale sabe bem da importância dele – só pode ser explicado por uma pessoa: o Saci.

Monday, June 11, 2007

Hermanos Para siempre

Que me perdoem todos os filhos únicos que nos visitam, mas ter irmãos é maravilhoso. Não adianta primo, amigo próximo, vizinho da mesma idade que vive na sua casa. Tem que ser irmão. Não precisa ser biológico, claro, mas tem que viver junto, sob o mesmo teto, sob as mesmas condições.

Você só aprende a dividir as coisas, de fato, quando passa anos da sua vida dividindo atenção da senhora sua mãe e do senhor seu pai. Quando tem que esperar pra tomar banho porque tem outro fulano usando o chuveiro, quando usa roupa repassada do irmão mais velho ou repassa seu tênis pro irmão mais novo.

Você percebe da maneira mais delicada possível que não é e que não pode ser - o tempo todo – o centro das atenções. E que também não é o alvo de todas as expectativas que os pais colocam em cima dos filhos.

Você só entende o que é cumplicidade de verdade quando se alia com o seu irmão em busca da vitória “contra” os pais, quando vocês os convencem a comprar um cachorro, uma bicicleta nova ou de que não tem problema faltar na escola em plena quarta-feira sem nenhum motivo. Ou quando escondem as fotos antigas com as roupas ridículas e típicas dos anos 80.

Ninguém sabe se defender de verdade se não se acostuma com o fato de que o “inimigo” mora logo ao lado e que pode levar uma voadora pelo simples fato de estar sentado do lado direito do sofá ou porque esta com o controle remoto nas mãos. E também não aprende a perdoar de coração se os socos trocados no meio da tarde não forem pura tradição familiar.

Você aprende a respeitar naturalmente as diferenças entre as pessoas. Não porque sua mãe te disse (um filho único pode fazer isso), mas porque às vezes é obrigado a ouvir Inimigos da HP ou Sepultura e mesmo com vontade de estourar os tímpanos, releva o fato. Porque mesmo gostando de assistir episodios repetidos dos Simpsons, você continua sendo amado.

Ter irmãos (mais novo, mais velho, homem ou mulher) traz uma sutil segurança de que sozinho no mundo você não fica. De que vai ter com quem dividir as alegrias e as desgraças do futuro e ajudar a cuidar dos pais, que invariavelmente envelhecerão e precisarão de cuidados.

Pode ser que a dinâmica de outros irmãos não seja bem esta, mas te faz mais próximo das pessoas. E intimidade, ao contrario do que dizem por ai, não é uma merda.