Friday, December 14, 2007

São as Águas de Dezembro

Minha mãe, em sua eterna (e aparentemente inútil) busca por me fazer ver o lado bom das coisas, ao me ver resmungando por causa da chuva que caía, ponderava: as plantinhas precisam de água. Já imaginou o mundo sem plantinhas? Eu nunca vislumbrei tal cena, a primavera esplendorosa no jardim de casa me conformava e me fazia concordar com a véia.

Isso e todos aqueles verões que passamos no quintal ou na rua, tomando chuva do fim de tarde e ignorando os pedidos dos tios para sair do mar com medo dos raios. Em meados de janeiro, em 90 e poucos, na Baixada Santista, se não me engano, um casal de banhistas havia morrido por causa de um raio, o famoso “raio-mata-dois”. Mas eu não era banhista. Banhista é um termo bobo que a Globo usa pra designar os barrigudos cervejeiros e suas esposas que descem para Mongaguá e ficam curtindo o mormaço. Eu era uma criança que gostava de nadar na chuva e me recuperar dos pingos gelados na água quentinha do mar.


Tia Leila, que havia desistido de gastar a voz chamando as filhas e a sobrinhada toda, só sinalizava o dois com os dedos da mão e a gente saía correndo pra casa gargalhando do tal do raio assassino. E ele não matou ninguém. No fundo sabíamos (Tia Leila, inclusive) que era inofensivo.

Se for possível uma divisão tão boba das pessoas, ei-la: as que usam e as que não usam guarda-chuva. Eu sou do segundo grupo. Minha escova definitiva pode ter influenciado esse quadro. Queria ver se tivesse o cabelo pixaim, sairia correndo da chuva feito o diabo da cruz, já ouvi. Mas se vocês vissem a situação do meu cabelo agora, ponderariam se é essa mesmo a razão de eu não usar guarda-chuva. Gal Costa invejaria o volume da minha juba.

Pitoresco é eu escrever boa parte deste texto no meio de um temporal. Se gosto de tomar chuva na rua, na praia ou na casinha de sapé, dormir com o barulho dela batendo na janela é uma tortura chinesa (ou colombiana se considerarmos a pobre Ingrid Bettancourt, seqüestrada pelas FARC). Morro de medo. Vez e outra a mesma mãe que falava dos benefícios da chuva, entra no meu quarto pra conversar enquanto esperamos ela passar. Em novembro recomeça a época das tempestades e do meu sono atrapalhado.

Aqui na Avenida Paulista é um carnaval de estampas sobre as cabeças das pessoas. As “sombrinhas” parecem ter sido desenhadas pelo Joãosinho Trinta. Com um ventinho mais forte, o aparato - que custa R$5,00 nos dias ensolarados e R$15,00 durante os temporais, se desdobra inteiro e o pobre dono passa um vexame tentando se recompor. Eu mesma, incauta, esperando para atravessar a rua, já quase fui cegada pelo arame de um deles, o que só aumentou meu ódio. No metrô, já com as canelas molhadas até a metade, as pessoas sacodem os guarda-chuvas e vão molhando o pouco que restou de seco nos outros como se nada fosse. Depois o enfiam na bolsa, que deve acabar o dia cheirando a cachorro vira-lata.

Tem também os que, ao menor sinal de chuva, correm. Vi na televisão que você acaba se molhando mais se correr. Essa parte eu não sei porque mal me lembro como se calcula a velocidade média de um carro, mas sei que o risco de escorregar no piso molhado e se estabacar aumenta cerca de 80%. Esse dado, é claro, não é da Unicamp, eu mesma inventei. Se é pra molhar, molha direito, detesto garoinha fina. O ditado “se está na chuva, é pra se molhar” nunca foi tão bem aplicado por mim.

Guarda-chuva ocupa espaço, é feio, espeta o olho dos outros... Desistam. Guarda-chuva só atrapalha. Não há guarda-chuva nem contra o amor, já disseram (acho eu) os Titãs.