Friday, September 22, 2006

O Luau em Peruibe

Uma das piores desgraças que podem ocorrer a um ser humano por volta de seus 17 anos é se ver de férias com os pais e alguns amigos na praia, pouco dinheiro no bolso e nenhum meio de locomoção motorizado. Essa me parece ser a única explicação plausível para que alguém organize ou participe de um luau. Para mim, é claro. Experiências próprias e nem tão recentes me disseram o contrario: há, sim, quem goste.

Como não tem carro nem idade para dirigir, o pobre jovem se vê num mato sem cachorro, sorte que não está sozinho nessa, há dezenas de outros na mesma situação. Eles querem beber, fumar maconha, tentar pegar mulher... Não havendo outra saída, encontram com pouco esforço um camarada que diz saber tocar violão e pronto, a diversão noturna esta armada.

São raras as meninas que entendem o espírito da coisa. Uma vai de saia curta, a outra de salto e a terceira esquece da umidade do mar e só vai perceber que a escova no cabelo desandou quando chegar em casa. O mais lesadinho do grupo tenta atear fogo em galhos molhados e acaba estragando o isqueiro. A grande maioria restante fica em volta da garrafa de Soda Limonada quente preenchida com vodka Tchaikovsky também quente, mas ninguém se incomoda em entornar a mistura explosiva no gargalo.

A areia molhada na bunda não parece atrapalhar o aquecimento do companheiro do violão claramente desafinado. Ele tenta tocar o Brasileirinho e todos acham que as cordas estão estourando. Não tinha medo o tal João de Santo Cristo era o que todos diziam quando ele se perdeu... Não preciso nem falar que depois das goladas do drink, todo mundo se perdeu na letra da famigerada canção.

Algum menino de apelido esquisito (Planc, Meleca, Lombriga...) acaba de assumir o posto de Zé Droguinha da turma e vai preparando o beck, véio, que acabou parecido com um bombom Sonho de Valsa. Mesmo assim, pra chamar a atenção do mulheril, um e outro discorrem sobre a importância de Jah nessa Era. Bob Marley e Gilberto Gil:
tudo, tudo, tudo vai dar pé... no woman, no cry...

Meia dúzia levantou pra dançar forro mesmo ouvindo Tears in Heaven do Eric Clapton, é o álcool batendo na cabeca do pessoal. Pelo mesmo motivo, o gordinho suado tenta (em vão, claro) agarrar qualquer espécie do sexo feminino que encontra pela frente; a baixinha de nariz esquisito liga pra melhor amiga que ficou em SP se lamentando por algum amor mal-resolvido; a que estava de saia encarna a Sharon Stone caiçara e nem liga; o maconheiro declara que viu os sete anões andando pelas redondezas e sai em busca da Branca de Neve.

Apesar de parecer concentrado em sua performance, o rapazinho do violão não se esquece de beber e dar suas tragadas também. Logo ele, que sóbrio não servia pra tocar nem em quermesse de interior, resolve desafiar a si mesmo (e a paciência dos outros) tocando Patience, com direito aos assovios e a mexida de cabeça do Axl Rose. Quem passa por ali não sabe se ele esta recebendo um espírito ou falando Javanês.

Já passam das 4 horas da manha, contudo, o luau só se da por encerrado quando tem dois vomitando, um dormindo, pelo menos uma mulher chorando e um outro coitado com medo do pito que vai levar quando chegar em casa. Uma caravana segue a pé rumando as casas, já combinando o que farao no dia seguinte. Antes de mais nada, atacar as sobras do churrasco pra matar a fome.

Tuesday, September 12, 2006

As pessoa tudo

1)
- Gérson, tive uns pobrema hoje...
- Fala Naldo, que que tu apronto rapá?
- Prontei nada não, só tentei arribar umas coisa lá em casa.
- Arriba o que?
- Eu e a Keyla rabisquemo uns desenho lá pra puxar um quartinho nos fundo.
- E ai?
- Só sei que rabisquemo, rabisquemo e rabisquemo e num encontremo solução.
- Pior é eu.
- Que que ta pegando?
- To com uns vazamento na laje....
- Vixi meu!
- É memo...achei que se eu tirava a caixa de a´gua dava menas manutenção...tava entrando sujeira.
- Mas e aí?
- E ai nada, ta dando uma pá de mofo na parede dos minin...
- Mas Naldo, porque tu num pois uma tauba pra cobri ela?
- Ta ai, tu é muito esperto memo, vou roubar uma tauba da obra lá perto...


2)
- Dayane! Dayane! Tua mãe ta te chamano lá dentro!


- Oi mainha, fala.
- Dayane, eu num vô mais ficar cum a tua neném!
- Porque mãe?
- Por causa que em vez de você arrumar um serviço você fica dando piscadela pra esses moço aí do bairro.
- Ah mãe, pára de me fica me encheno! Eu já tenho 16 anos! Quero ir pro salão dançá né!
- DançaR minina, dançaR! Dançá o que?
- Ai mãe, sou eclética...danço funk, uns black, uns forró! Uns régay também!
- Com aqueles malandro tudo né!
- Nada não mãe! Cum as menin aqui da rua, a Jaslana, a Jéssica e a Catymilla!
- Quero só vê hein Dayane, tu ta maior folgada! Então ta, daqui a neném...cadê a Joelma?
- Tó mãe, cuida dela por causa de que as criança da creche ta cum uns catarro escorrendo, ela num pode pegar pé de vento.
- Ta fia, vai lá! E vê se vai de calcinha pra num ganha neném né!




3)


- Berenice, senta aqui com eu pra nóis conversa...
- Claro Margaretty, vô pega umas mexirica pra nóis i comeno...
- E aí fia, como ta as coisa?
- Ai ta indo né Má....o Jefferson arrumou um serviço, ele fez uns curso de zininformática né?
- É... o fio da minha colega lá do serviço que eu fiz no ano passado na casa da dna. Leila também feiz.
- Intão minina, e vc e o Naldo?
- A gente ta com uns pobrema na laje né, mais ele que é um besta memo, que num sabe faze nada. Ô diaxo de homi! Se num fosse esse cavalão na cama acabava memo era eu dexano ele...
- Faiz isso não amiga...Vê só que outro dia tava falano com uma colega no circular e ela contou que o marido dela foi pro bar cum uns amigo né? Aí a cumadre dela que é prima de uma colega da tia dela falo pra minha amiga que um colega dela contou ,porque uma meia irmã dele, que é de menor, viu, o esposo dela saino da casa da Marlene, uma mó facinho que tem lá perto da casa dela lá....
- Jura?
- É! Mais aí a minha colega chamo o marido na sorveteria do bairro, pego ele pelos cabelo, ameaço ele com uma garrafa quebrada que se ele fosse se engraçá com aquela piranha de novo ela cortava os bago dele fora!
- Minina jura?
- Juro! Aí ele deu um tapa na cara dela, disse que rapariga assim era semente da discórdia e que ele num se enfronhava cuninhuma delas!
- Cachorro!
- Se é cachorro eu num sei, mas olha lá, ele se resolveram tudo a situação! O amor é bunito né! Inscrusive porque ela tava esperando neném, toda embuxada e ele bateu de leve, afinal ela tava dando ao luz ao sétimo fio dele!
- Mas e os outro dois?
- O Marcondes ela num sabe de quem é o Wallace é do segundo marido dela...
- Ah ai sim, tudo bem....vô entrar minina...vô ver o seu Gugu....a Joelma vai cantar!
- Vai lá muié!


E LEMBRANDO QUE TUDO ISSO NÃO TEM GRAÇA NENHUMA....

Sunday, September 10, 2006

Rock Sujinho

Lá vou eu de novo discorrer sobre barzinho. Ao invés de Vila Olímpia, a parte menos abastada do bairro de Pinheiros. Troque o pop/rock por rock. “Mas rock mesmo, não essas babas que tocam nas rádios”. Aaah, ta, sei...

Para se chegar ao estacionamento mais próximo, tem-se que andar uns 8 ou 9 quarteirões e o flanelinha acaba sendo a saída. Cabelos compridos, all star cano alto ou coturno gasto, camisetas puídas do Iron Maiden, Pearl Jam e Angra para ambos os sexos, camisas de flanela, a verdadeira sucursal de Seattle.

É festa de confraternização “lá do serviço, fica chato não aparecer”. Fecham uma mesa com cadeiras desconfortáveis e a cerveja – pelo menos – é gelada com preço justo. Pinheiros e Vila Madalena levam cerveja a serio, não ouse não pedir Original. O povo vai chegando e a banda ensaia os primeiros acordes da guitarra e do baixo:

- “SOM. SOM. SOM... 1, 2, 1, 2, 3, 4... Se um dia eu pudesse veeer meu passado inteiro. E fizesse parar de chover nos primeiros erros... Soool, meu corpo viraria Sooool...”

Ainda estão na terceira musica e a gordinha de tailleur de microfibra turquesa já demonstra sinais de alguma embriaguez. Pessoal da informática ainda discute os pênaltis do Rogério Ceni e o do financeiro defende o PSDB com argumentos talvez infundados.

- “O que? A Marta? A Marta acabou com a cidade...”

- QUE PAIS E ESSE???? QUE PAIS EH ESSEEEEEEE?? - pergunta o vocalista da banda cover.
Tem coisa mais deprimente do que banda cover, eu pergunto?

O próximo bloco do show tem a seguinte definição: musicas que as pessoas só sabem cantar duas frases. Começando com Eagles: Welcome to the hotel Califórnia. Such a lovely place, such a lovely face. Prosseguimos com Doors em sua famosa Roadhouse Blues: let it roll, baby, roll. Let it roll all night long. (nessa hora a gordinha de tailleur - que provavelmente trabalha no rh e tinha uma reputação a manter, já o abandonou na cadeira, perdeu as estribeiras e esta na frente da banda rodopiando conforme o refrão da canção).

Ainda esta faltando o encerramento do bloco com o hino-mor das musicas que as pessoas só sabem cantar duas frases. Com vocês, Creedence Clearwater Revival. “Iiiiii wanna knooooow have you eeeever seen the rain? **Comin’ down, sunny day**”.

**Saber essa segunda parte é privilegio de poucos.

A essa altura do campeonato, a arruaça esta armada. A política deu lugar pro “rabo da gostosa da recepção”, as camisas sintéticas da rapazeada já apresentam as famosas rodelas de suor. As mulheres comecam a ficar assanhadas (geralmente as feias). Ninguém se lembra mais dos roubos de canetas boas, do empiastro que manda ppt com narração do Cid Moreira todo dia, das comidas de rabo do chefe que acorda sempre de mau-humor.

Apesar de tentar (em vão) imitar Kurt Cobain em Smells Like Teen Spirit, o cantor do “conjunto” infelizmente não adquiriu rouquidão vitalícia e o show prossegue. Hora de levantar os isqueiros. Hora das baladas.

Da pra imaginar o que o guitarrista de uma banda que toca em véspera de Natal num bar apertado na Mourato Coelho é capaz de fazer com o solo de Stairway to Heaven? Jimmy Page passou a sentir pontadas nos rins e ninguém sabe explicar o porque. Quem ouviu sabe, mas evita tocar no delicado assunto com o musico amador.

Se depois dessa ninguém relembrou da Malu Mader na novela Top Model de 1989 nem começou com lamurias é porque alguma coisa vai mal e a banda percebe o clima de longe: “U2. UUU-HUUUU: With or without yoooooou. With or without yoooou oh oh...

Alguém começou a chorar e quem bebe sabe que não precisa de motivo razoável para isso. Ex-namorado, bofe que não liga, chifre, cachorro que morreu há 10 anos, salário ruim, sapato apertado. Só há 3 coisas a se fazer: pedir a saidera, enxugar as lagrimas e tentar lembrar o caminho de casa (“ai, meu deus, fiquei de deixar fulano em casa. Vou fingir que esqueci!”).

Quando se pensa que a tristeza esta acabando, Renato Russo e sua trupe ressurgem das trevas musicais para o eterno hino de amizade, consciência social e, por que não, cafonice? Braços erguidos (dedos queimados pelo isqueiro) balançando de um lado pro outro, como num culto evangélico louvando ao Senhor. “É preciso amaaaaaaar as pessoas como se não houvesse amanha…”

As luzes acendem, o flanelinha te cobrou 10 reais por não ter feito nada, o "colega" que te pediu carona grudou no seu braço e é fato que o caminho de volta sera tortuoso. Ao contrario do que disse o finado companheiro acima, o amanha vai existir e sera ressaquento.

Saturday, September 02, 2006

Aniversario na Vila Olimpia

Tenho muitos traumas. Um dos mais importantes foi ter nascido no meio das ferias de verão. Bem período em que todas as criancinhas se mandavam pra Ubatuba ou Guarujá e só voltavam no reinicio das aulas. Não bastasse, ainda é no mesmo dia e hora da minha mãe.

Provavelmente por isso não estou acostumada a fazer grandes comemorações (a não ser pela festa temática da Hello Kitty) e peguei birra quase mortal de gente que faz aniversario em barzinho. Obvio que ninguém é obrigado a fazer festa de aniversario e bancar comida e bebida pra cambada toda, mas há limites.

Pra não ofender ninguém, é sempre escolhido aquele barzinho arroz com feijão... Ninguém ama mas também ninguém sai de lá reclamando. Chooovem scraps no orkut, email, nick de messenger e alguns aniversariantes ate ligam pra confirmar presença e perguntar quantos nomes precisa por na lista. Os mais especiais avisam que "é só dizer que é o meu aniversario que você já tem desconto”.

A priori nenhum desses encontros é caro. Dez reais pra entrar no barzinho escolhido não me empobrecem nem enriquecem, o problema é que alem de não sair satisfeita, no final da noite NUNCA SAO SO DEZ REAIS. Some ali mais 10 de estacionamento, 8 da gasolina que você gastou ao ficar parado no transito da Faria Lima com ar condicionado ligado pra não ter que baixar o vidro e ouvir gracinha de motorista de Civic emprestado do pai e mais 4 da Skol Bocao que comprou no posto do caminho pra ir relaxando.

Quarenta minutos depois (mas antes da meia noite, senão o preço sobe e você se ferra ainda mais), você encontra o local, vê fila na porta e se arrepende. Muito tarde pra dar meia-volta, o manobrista já saiu cantando o pneu do teu carro e o aniversariante já te viu. Nome, telefone, data de nascimento na comanda e você finalmente consegue pisar no bar.

Mais 10 minutinhos e 2 chopps superfaturados depois, o garçom aparece com a sua cadeira, que foi milimetricamente projetada pra te encurralar entre a pessoa mais chata da mesa e o mais desconhecido. Tem também o abstêmio, que alem de ficar te oferecendo bolinho de mandioca com carne seca e pastelzinho de palmito ainda olha feio enquanto você tenta fazer tinquina na sua comanda.

A essa altura você se lembra que dos 10 reais que pagou de entrada, 7 são couvert artístico pra uma banda de pop/rock nacional/internacional e eles voltam do intervalinho: "eu quis dizer, você não quis escutaaaar"; "save tonigh and fight the break of dawn, come tomorrow..." ; "fazer amor de madru-ga-da paramparamparamparamram"; "i can`t always be waiting, waiting on yooou..."

Sua garganta parece ter vindo de fabrica acoplada a um funil de óleo automotivo e você certamente esqueceu que em dado momento do mês o dinheiro acaba ou que tem coisa melhor em que gastar. O que importa é que o garçom entenda suas necessidades: chopp atrás de chopp. Inclusive, não se esqueça de perguntar se há alguma promoção de drinks da casa. Double Lagoa Azul All Night pode parecer uma roubada, mas depois do segundo você nem faz mais careta e vai sair de lá mais bêbado do que qualquer um que entrou.

Os amigos que juraram pela mãe mortinha que não iriam furar, furaram. Dois sms recebidos tentando justificar e outros quatro que você fingiu que recebeu só pra não ficar sem graça na mesa e tentar fazer com que acreditem que tem programa pra depois. "Se eu não tivesse bebido o que eu bebi aqui, tinha sobrado algum pra encontrar o resto do pessoal...", você reflete.

Tarde demais. A mesa começa a esvaziar e depois que o aniversariante tirou sua pior foto da historia ao lado daquela gente toda com um prato de bolo rançoso na mão, você pede o 11o. refil do drink e fica mais sociável. Cantarola discretamente mais uma musica do original repertorio e relembra dos velhos tempos em que era amigo de alguém ali (principalmente daqueles tempos em bastavam 2 caipirinhas pra te deixar de porre).

O pessoal começa a se levantar e a dar tchau ao mesmo tempo e o couro do seu sapato quase mugiu de tanto pisao que levou - lembre-se, isso não te incomoda mais! E com 10 pessoas a menos na mesa, cogita-se arrematar aquele ultimo provolone a milanesa engordurado que eles deixaram no prato."Naaao, tem Burguer King aqui do lado, depois eu passo lá!"

Fila no caixa, dancinha pra tapear a vontade de fazer xixi. "Quarenta e nove?? Com os 10% já, ne? Ta, passa no debito, pra mim, por favor". Suspiro aliviado que o cartão resolveu ser bondoso com a sua pessoa, mais 15 minutos no frio esperando o carro - que chega com o banco e os espelhinhos desregulados pelo manobrista. Em cinco minutos você passa na frente do Burguer King e nega a si mesmo a possibilidade de estarem distribuindo os sanduíches gratuitamente, tamanha a fila. Passa reto.

Começa a rezar pra deus que não existe ter te preparado algo pra comer ou pelo menos pra passar nos faróis vermelhos da Santo Amaro sem grandes percalços. Reza outra vez no elevador de casa, pra não molhar as calcas antes de chegar ao banheiro. Lasanha gelada, pijama de flanela, cachorro latindo e sleep time na tv de 15 minutos bastam pra deitar na sua cama jurando pela sua mãe mortinha que nunca mais vai a um desses.